Das entranhas de um livro não acabado. [2]  

Posted by [The]Lirium

"[...] - Nós temos que fazer algo por ela.

O homem, cansado de esperar e irritado o bastante por ser ignorado, desceu do cavalo e sacou uma espada prateada. Aproximou-se da mulher que entendera a mensagem e agora sorria com o pouco de força que ainda restara no corpo, e com a lâmina em seu pescoço, cortou-lhe a garganta."

Das entranhas de um livro não acabado.  

Posted by [The]Lirium


"[...] Naquela manhã distante, na quietude do mundo, quando havia menos barulho e mais paz, e quando a menina estava com uma das mãos sobre a cabeça machucada e a outra lhe cobrindo a boca, num súbito reflexo de susto e surto, ele apareceu.
Se vocês pudessem ao menos vê-lo, parado à porta, como se estivesse adormecido, certamente entenderiam e poderiam imaginar como a atmosfera ficou densa e o tempo pareceu andar em passos de tartaruga. E se ao menos vocês tivessem ouvido apenas um oitavo do que eu já ouvi falar dele, assim como de um Mago de outra história! Histórias de aventuras brotavam por todo lado, e certamente, outra estaria para surgir. Quisesse ou não.
Tudo o que a menina viu, naquela manhã, foi um rapaz."

太鼓  

Posted by [The]Lirium

Su-Ton-Su-Ton-Do-Don-Do-DON!


Ainda lembro-me quando decidimos, acovardados.

Uma viagem curta, até um lugar utópico onde alguns meditavam, e outros lutavam. Não havia flores, os tempos não eram bons. Tudo era deveras novo, mas com aparência antiga.

Aos poucos, começamos. Cantarolando aquelas palavras que ainda não eram conhecidas por nós e faziam nossa língua enrolar de um jeito estranho. Não sabíamos seu significado, nem mesmo sentíamos a freqüência das batidas ressonando pelo salão – fazendo os vidros vibrarem. Eu não sentia.

San-To-Ko-Do-KOI!

Um, dois, três dias. Dalí a pouco somavam-se semanas. Uma vez a cada. Mas aqueles sete dias que antigamente relutavam em passar, agora corriam sem espera. Começamos a ansiar pelo Doyōbi, pois já vibrávamos quando ouvíamos o som dos tambores. Sentíamos aquela freqüência inumana que vinha do nosso âmago. Urrávamos através dos nossos braços velozes, ritmados. Já estávamos habituados. Nossos ouvidos eram acariciados por aquela melodia que cochichava de forma compassada através da nossa carne. Da nossa alma.

Sentíamos e cantávamos, agora sabendo o que tudo aquilo significava.

Se esse sentimento voraz e intrépido é o que os poetas chamam de loucura, o batizo, agora, de simples e cândido: Amor.

O mais puro e intenso... Como as batidas das ondas do mar.


Yō-San!

Sala 67  

Posted by [The]Lirium

Despertar pela manhã ainda oculta. Bocejar uma, ou duas vezes. Ligar a ducha e esperar que ela purifique aquela alma desbotada. Vestir-se com uma camiseta gasta de uma banda desconhecida, e calçar o velho tênis escarlate. Os cadarços, aos tornozelos.

O café que já virou chá. E a porta de madeira. Através da manhã já desperta, mas glacial.

Atravessar as ruas, calçadas, deparar-se com as mesmas pessoas, embora não lhe saiba os nomes. Ver ao longe aquele grande castelo contemporâneo, e logo sentir que a distância já está se encurtando. As escadarias: Subi-las. A ânsia é visível: Engula-a.

O Elevador. Embarcar ao lado de uma velha pomposa com seus óculos dourados Dior da década de 50, junto com uma jovem com atributos visíveis e batom rubro que contrasta nada perfeitamente com seus cabelos amarelos, e um homem ocupado demais para perceber sua presença, com seu jornal defronte a face.

A porta fecha-se, e sobe.

Segundo andar. Terceiro, uma parada. A velha sai, fazendo um barulho nervoso com seus tamancos de couro branco. As portas movem-se demoradamente.

Quarto andar e outra parada. O homem com o jornal ainda tampando-lhe a visão, sai apressado pela porta e esbarra em um jovem que ocupa seu lugar no elevador. Este olha para a loura, mas logo disfarça a entreter-se com as alças da capa de um violão.

Quinto andar. Sexto. As portas que agora abrem são para o rapaz, e para você. Os dois saem, sem olhar para a loura que passava outra camada de seu batom vermelho a preparar-se para a próxima parada.

Atravessar uma porta de vidro talhada com uma clave de sol. Nunca reparara antes no quanto uma clave de sol pode ser tão insignificantemente frágil?

Sentar-se em uma poltrona marrom, e logo ouvir um estranho barulho ao chocar-se contra suas pernas. Abaixar a cabeça e aguardar, ansiosamente.

O rapaz tira de seus bolsos uma chave, e apressa-se em abrir a primeira porta do pequeno corredor. Ele olha para você antes de entrar, mas não recebe outro olhar. Alguns minutos depois de tê-la fechado, um belo som, austero, tocado pelas cordas de uma guitarra, soa pelo sexto andar. Mas logo uma pessoa de você se aproxima, e diz que pode usar a sala 67. Já a conhece, a sala, de longa data, e por isso sorri ao levantar-se. Com oito passos.

Fechar a porta.

Aquele piano negro está a sua frente, ele tem essa mania estranha de deixar-te receoso... A imagem dele soa como uma proposta indecente de um duelo. E você, curiosamente, sempre a aceita.

Sacar o caderno de partituras, sentar-se defronte ao teclado, e colocar-se a tocar.

Suas costas eretas. As pernas que se contraem ao tocar o pedal. Seus dedos dançam como nunca. E você sente seu coração palpitar rapidamente... Fecha os olhos. Vibra. Incita. Recita. E inspira intensamente.

Sua última melodia.

Agora você está em pé, abrindo aquela grande janela que sempre te deu a visão completa daquela cidade. Sorri gentilmente para as nuvens, antes de encarar amargamente as pequenas pessoas que sempre se moveram com a rapidez de um antílope. Corram! Corram! Como correm! Mas você nunca ligou para isso. Não é?Não corra!

E como um pássaro que não possui asas...

Jogar-se contra o nada.

A cantarolar uma última melodia.



Despertar pela manhã ainda oculta. Bocejar uma, ou duas vezes (...)